17 de agosto de 2009


Perhaps when we find ourselves wanting everything,
it is because we are dangerously close to wanting nothing.
Sylvia Plath (1932 - 1963)

Um dia encontrei-me a desejar tudo. Não sei como cheguei a essa situação, mas um dia chegou até mim. Veio sorrateiramente como uma sombra cresce na noite, à medida que nos afastamos da luz que se projecta sobre nós. Começa por um simples desejo de algo que não podemos ter, passa-se para outra coisa que não podemos ter, na vã tentativa de compensar a falta da primeira, e assim por diante, acabando-se por desejar quase tudo, num ciclo quase infindo de desejos impossíveis...

Imaginemos isto: no início era a Ordem, e a Ordem mantinha tudo a funcionar em harmonia e perfeição. Certo dia, uma das partes do Todo que era a Ordem, ganhou vontade própria e olhou à sua volta. A vontade que lhe adveio deu-lhe personalidade (ou teria sido vice-versa?) e deu consigo a querer não ocupar aquele lugar mas sim outro que tinha visto ao longe. O problema é que ele tinha sido criado para ocupar o espaço onde normalmente estava e qualquer outra função era impossível de ser desempenhada com eficácia. No entanto, esta vontade impeliu-o a partir e a ocupar a posição que desejou. Assim chegado, tentou fazer aquilo que pensava conseguir fazer mas só conseguiu fazer o que normalmente fazia. Vendo que aquela posição lhe era adversa, olhou novamente em redor e encontrou outra posição que ambicionou. De novo, moveu-se e tentou fazer o que nessa posição era preciso mas de nada lhe serviu. Assim continuou indefinidamente. Entretanto, esquecera-se do local de onde tinha provindo e de como aquilo qe fazia, por pequeno que fosse, era importante para o bom funcionamento do sistema em que estava incluído, para a boa manutenção da Ordem, pelo que, a cada nova tentativa de adaptação, o sistema desequilibrava-se um pouco mais visto que as outras partes dependiam do que lhes chegava às mãos, e o que lhes chegava às mãos não era o que devia ser. Não se estranhe, pois, que, lentamente, a Ordem foi dando lugar ao Caos. Tendo visto que o Caos avançava, essa parte que tinha vontade própria tentava, tudo por tudo, manter-se nas zonas onde a Ordem ainda se verificava mas, a cada coisa que tentava fazer, o sistema ficava cada vez mais desequilibrado. Certo dia, parou. Olhou em seu redor e viu que, agora, era o Caos. O sistema tinha ficado desequilibrado irremediavelmente. Olhou em sua volta e viu que não havia sítio nenhum ao qual desejava pertencer. Pior, tentou lembrar-se do sítio ao qual pertencia e não conseguiu. Tudo lhe era estranho, já não era o sistema que tinha conhecido. Tentou lembrar-se do sistema mas também não conseguia: só tinha o leve vislumbre de que aquilo não era suposto estar a acontecer. Por fim, não aspirou a mais nada, nao sabia ao que aspirar, o seu propósito tinha expirado. Porque, no fim, tudo era o Caos e nada estava certo; porque, no fim, tinha-se iludido que poderia ter algo para o qual não tinha sido feito, estava num mundo que não era o seu.

Olho à minha volta e reconheço as coisas que aí estão. Sei que já aí estive, que já aí vivi uma parte da minha vida mas parece-me tão remota que nem parece ter sido nesta vida... parece ter sido uma outra, bem distante... não sinto as minhas raízes, não sinto o que fui, nada disso me diz o que quer que seja... É uma sensação estranha, mas é quase como se me tivessem derrubado tudo e dissessem: "agora, reconstroi.". Que quero agora? E como?

1 comentário:

Sílvia disse...

Et voilá! Cá estou eu!:)

Neste momento não quero tudo, quero paz para saber o q quero e para ter sossego para reconstruir...