14 de janeiro de 2009



"Estou além sono, num sonho de papel, fio de ópio, sombra chinesa tatuada no céu.
Hoje não me apetece ser do contra, uma enfant terrible
..."


Intangibilidade da vida. Tocarmos como se fosse a nossa própria mente e alma, a essência de outra pessoa (que não são só estas duas coisas...). Muitas vezes o disse e torno a dizer: nós não estamos preparados para nos apercebermos como é que outras pessoas estão a percepcionar o mundo, como é que nos percepcionam. Há algo que nos "tapa" o caminho e que nos deixa atónitos na espessa tarefa de compreensão do próximo. Pedimos uma bússola, pedimos um mapa para as profundezas do ser de outrem mas de nada serve pedir a um mapa a quem o não pode dar porque nunca ninguém se deu ao trabalho (nem conseguirá) conhecer-se o suficiente para delinear um mapa conciso e universal de si...

"...Quero apenas os novos códigos, quero apenas entrar e participar..."

Posso espreitar pelas janelas e observar de fora. Olho pelos portais do Tempo e observo que é isso mesmo que tenho feito, com raríssimas excepções: observo de fora, como que tentado pelo brilho das luzes e do calor de "lares" diferentes do meu... É o fascínio do diferente, procurando sempre, no entanto, o Semelhante, aquele gesto que compreende cada passo que se dá, cada gesto que se executa, sem dúvidas, sem confusões, sem pó que arranhe a agulha no disco da Partilha...

"
A cidade está submersa numa manhã chuvosa
Pântanos e dinossauros tomas de assalto as avenidas
A menina tem insónias e só às vezes dorme
Desaparece e acorda com fome... acorda com fome...
Esta é a minha nova dor. Diz-lhe olá... Não a faças esperar..."


Passando pelas ruas cinzentas, passeio as minhas dúvidas, incertezas, tempestades da Alma, do Coração e mesmo até da Mente... olho as Sombras e estabeleço imensas analogias, paralelismos, comparações e perco-me nas infindas hipóteses que se me levantam... somos um Universo interno, já se sabe... as Sombras que se levantam dentro de nós podem ter metros, quilómetros mas podem ser geradas por algo tão irrisório como um pequeno rato em frente a um projector. E é isso que as pessoas às vezes se esquecem: é que para haver sombras, tem de haver Luz, uma grande Luz, uma Luz tão forte que tudo ilumina os confins do Universo... é dificil não olhar para a sombra é mais confortável, a Luz pode cegar...
Prossigo. Por entre pedras, muros, calçadas e escadinhas aprecio o ritmo de uma comunidade que mal se olha nos olhos... têm medo de quê? de encontrar a alma dos outros?... é difícil... Entrando num tunel, abobadado, começo a cantar...

"
Oh! meu Anjo da Guarda, eu sei que te dou trabalho,
Eu e Tu somos iguais... eu queria tanto fazer-te feliz...
Não esperes que eu consiga mudar da noite para o dia..."


... e sem saber estou a fazer eco. Impossível! Num sítio tão populoso! A esta hora! Com o "barulho das luzes" ninguém deveria notar... noto eu... soa bem, estranho timbre que me é devolvido. Deixo-me entao levar pelo que canto e pelo que recebo, numa estranha fusão de sons, como se numa catedral me encontrasse, embalado pelos acordes celestiais de um canto sacro... penso o quanto a Vida não o será assim também: tudo o que fazemos tem uma repercussão, muitas vezes superior ao que esperamos e, quando esta a nós retorna, a fusão resultante pode maravilhar-nos ou ser extremamente dissonante e estarrecer-nos. No entanto, são sempre pequenos sinais que enviamos para o exterior, como fragmentos de uma imagem, de uma música, que em nada nos conseguirão definir... porque, para se conseguir compor a imagem, é preciso Querer e Tempo... e é de Tempo que não Queremos dispor.

"Quando as palavras não dizem o que somos,
Gastamos em tinta, prometemos em sonhos,
Quando as palavras não dizem o que somos..."



8 comentários:

Ianita disse...

Será?

No início era o Caos.

Mas depois veio a ordem das coisas... cada um no seu sítio... a luz, a escuridão... tudo tem o seu lugar, até nós.

Se percebermos que não poderemos saber tudo, percebemos que não podemos saber-nos e que, por conseguinte, não poderemos jamais saber o outro. Mas... podemos tentar. Não podemos nem devemos desistir à partida, só porque é impossível... podemos tornar o impossível mais possível... dar mais um passo... estar mais próximo... da luz da escuridão dos outros de nós... tanto faz... mas mais perto em vez de mais longe... mais em vez de menos... mais.

Mais mais mais mais mais.

Kisses
(queres juntar uma comandita e ir matar o Cronos? Eu tenho um taco de baseball e muita vontade de o espancar!) :)

Hélio disse...

Ianita, bora lá!!! O velho anda bué rezinga e está a precisar de um "mass spanking"! Facada no bicho!!!

Esquadrões de tortura à parte, eu sei disso Ianita: é preciso nao desistir logo ao início. É preciso persistir e não desistir ao mínimo e primeiro sinal de contrariedade. Pena há quem não pense assim... Porque é da compreensão que vem o Entendimento e a Concórdia.

Beijinho e obrigado por teres cá vindo! :)

I.D.Pena disse...

Ena pá , gostei :) mesmo!

"Pensas?... Ou não existes?..."

Existo e penso sobre a existência do pensamento, será que existo mais ou menos por pensar ?

Hélio disse...

Grande "de la Peña" (desculpa mas tinha de dizer isto), ainda bem que gostaste, estamos cá para isso mesmo, mas acima de tudo para estimular as mentes e as almas.

Pois, essa é a velha questão. Eu prefiro ficar na zona cinzenta: basta que, por pensar, eu exista. Muita gente, por pensar demais, existe menos porque concentra nesse acto toda a sua vida, e o vice-versa também pode ser verdade. Agora, pensar sobre a existência do pensamento... deixa isso para os epistemologistas (Popper e assim) que eles é que gostam de tratar disso tudo... ainda tenho a "Crítica da Razão Dialética" e o "Ser e o Nada" do Sartre para ler. Quando o fizer, depois falamos... :)

Kayla disse...

Quase como espreitar pela janela de outro lar...
E sentir mesmo sem entrar o calor de outras vidas.Tirando as nossas próprias conclusões.
Acho...

Bonito!

OnlyMe disse...

É muito fácil expormos a nossa maneira de ser, os nossos pensamentos, as nossas verdades, apenas por palavras (quando se escreve tão bem como tu!). O difícil é conseguir gerir as nossas acções e as respectivas consequências perante a realidade. Existe todo um turbilhão de emoções com o qual não contamos e que altera completamente a nossa maneira de nos relacionarmos com os outros.
Quantas vezes, depois de analisarmos as nossas acções a frio, pensamos: - porque fiz...?! - porque disse...?! - Eu nem penso assim!! Mas foi assim que nos mostrámos!!
É muito complicado arranjar explicação para os nossos actos e o que representamos para os outros! Temos é de aprender com as nossas atitudes e as de quem nos rodeia, crescer como seres humanos e superar as nossas dúvidas e medos! É difícil - eu sei!! Mas desistir nunca e sermos influenciados negativamente por isso, muito menos! Devemos ser sempre nós próprios (independentemente dos obstáculos que encontramos pelo caminho)!!

Jinhos :)

sonhos/pesadelos disse...

"quando as palavras não dizem o que somos,gastamos tinta, prometemos em sonhos.."penso que as palavras escritas dizem muito sobre nós, e cada um que lê tira a sua própria elação sobre elas e sobre quem as escreveu.
são pequenos fragmentos e sinais da nossa existência....
bjs endiabrados

Lita disse...

"O nosso medo mais profundo não é que sejamos inadequados
O nosso medo mais profundo é que sejamos poderosos para além dos limites.
É a nossa Luz, não a nossa Escuridão, que mais nos assusta
Perguntamos a nós próprios, quem sou eu para ser brilhante, radiante, talentoso, fabuloso?
Na verdade, quem és tu para Não o seres? (...)"
Excelente texto... como todos os que aqui tens... :)