17 de setembro de 2009


In battling evil, excess is good; for he who is moderate
in announcing the truth is presenting half-truth.
He conceals the other half out of fear of the people's wrath.

Kahlil Gibran (1883 - 1931)

Never regret. If it's good, it's wonderful. If it's bad, it's experience.

Victoria Holt - pseudonym of Eleanor Hibbert – (1906 – 1993)

You better live your best, and act your best,
and think your best today,
for today is the sure preparation for tomorrow
and all the other tomorrows that follow.

Harriet Martineau (1802 - 1876)

When I do good, I feel good. When I do bad, I feel bad.
And that is my religion.

Abraham Lincoln (1809 – 1865)

You're never as good as everyone tells you when you win,
and you're never as bad as they say when you lose.

Lou Holtz - (n. 1937)

If you find serenity and happiness,
some people may be jealous. Be happy anyway.

Agnesë Gonxhe Bojaxhiu / Mother Theresa - (1910-1997)

   Em êxtase celebrou o sol. Esperava todo o ano por aqueles dias solarengos, quentes, em que a maresia lhe inundava o olfacto, e se permitia a longos banhos de mar, como o que acabar de tomar. Um ano inteiro de chuva era uma tortura, enfiada dentro de um escritório com um ar condiciado artificial, com pessoas a tossirem cheios de alergias e constipações pelas diferenças de temperatura, já para não falar do mau humor que tinha de aturar só porque se achavam no divino direito de ter que obrigar as outras pessoas a aturarem as suas birras e frustrações, e o chefe a gritar com eles e... ‘Basta!!’, pensou ela, ‘Aqui não é lugar para me lembrar destas coisas.’ Pegou no romance que estava a ler e abriu na página em que tinha deixado antes de ter ido ao banho. Antes de se concentrar na leitura, deixou-se levar pela sensação do sol a estalar na sua pele e do oceano que trouxe consigo: era optimo sentir a ligeirissima brisa a passar-lhe pela pele, a levar a humidade salgada para longe de si, a ser aquecida pelos raios de sol, numa alternância de calor e de frescura que a deixavam no céu. Se não era lá, era perto...

   Pôs-se a imaginar as gotinhas a evaporar, a largarem as mãos das outras gotinhas e a levantar voo, a serem levadas a outras paragens que ela, talvez, nunca chegaria a ver. Não fazia mal: iria viajar com elas em espírito. Recordou-se do pequeno poema que tinha havia muitos anos, na escola primária: ‘Uma gotinha caiu numa horta; outra caira num jardim e saciou uma rosa aí semeada; outra caiu numa piscina onde os meninos brincavam; outra, sozinha, caiu no mar, ficando triste, porque não poderia vir a fazer nenhum bem na companhia das suas irmãs...”. Riu-se com esta ideia. Tinham sido estas coisas que a tinham ajudado a manter a sanidade mental nos momentos mais complicados ao longo do ano. Também aí a praia tinha sido sua companheira fiel, mas sentia-se de mãos atadas por não poder gozá-la da maneira que queria: em comunhão perfeita de sentidos; na estação fria só podia ficar a passear pelo areal, observando o horizonte, o oceano e a praia. De certa forma estava distante do que realmente lhe dava prazer fazer. Uma vez, durante uma festa, perdera a cabeça, com os amigos e despiu-se completamente, indo mergulhar no mar durante longos minutos. Os colegas ficaram preocupados: era Inverno e o mar, revolto como estava, era muito perigoso. Mais para mais de noite. Quando ela chegou perto dos amigos, pouco restava da euforia inicial – ficaram a olhar para ela como se tivesse acabado de atropelar a mascote da escola. “És completamente louca...”, e voltaram a olhar para o jogo de cartas que tinham em mãos, sem dizerem mais. Ficara amargurada durante o resto da noite e sentara-se, em resposta, junto à beira da água, onde as ondas lamberam os seus pés, consolando-a. Não percebiam eles que o mar a chamara, que tinha que ir, simplesmente... ir. Era nestes momentos, sentindo-se incompreendida, que desejava viver na Grécia Antiga, para procurar por uma ordem de mulheres consagradas a Neptuno e dedicar a sua vida ao grande Mar. Tuda fazia sentido junto ao mar, tudo. Sempre que tinha problemas, vinha desabafar com ele; sempre que tinha alegrias, celebrava junto dele; sempre que queria mostrar alguma coisa especial, alguma pessoa, era ao mar que o fazia; sempre que estava enraivecida, descarregava no mar. Ele estava ali. Sempre estaria ali. Era o melhor ouvinte e o melhor conselheiro, nunca desapareceria, nunca a decepcionaria. Os seus ex-namorados chegavam a ter e a fazer cenas de ciúmes... E ela brilhava, Estrela do céu maior que vinha beijar o mar largo; eles só podiam ficar a assistir ao milagre que era o encontro daqueles dois, escrito no mesmo céu de onde tinha caído.

   Lembrando-se de tudo isto, agarrou num punhado de areia e deixou-a escorrer por entre o mindinho enrolado no punho, formando outro pequeno monte directamente por debaixo. Estava embalada pelas memórias e pela sensação da areia fina a escorrer pela mão, sensação única. Não era água, eram cristais minusculos e sempre que pensava nisso sentia-se maravilhada com o poder da Natureza, de como, sem máquinas, sem gastar nada, sem poluir nada, conseguiu criar uma areia tão perfeitamente fina. Mais uma vez o mar. Só a Água poderia ter sido a artífice de objecto tão maravilhoso e tão perfeito. Pegou noutro punhado e fez novamente a mesma coisa, e outra vez, e outra vez... Decidiu parar porque já uma vez assim adormecera e o mar apanhara-a, talvez chamado pelos seus sonhos movidos a água e sal...
   Pegou no livro e retomou a leitura. O sol aquecia-a e ela sentia-se envolta num imaterial cobertor de calor, quente na proporção certa: nem muito abafado, nem fresco demais. Novamente deu graças por ali estar e concentrou-se na leitura. Parava de vez em quando para olhar para o azul profundo daquelas águas que a rodeavam. A praia não era muito frequentada e o areal era extenso, muito claro pelo que a poluição visual de uma multidão espraiada com os seus chapéus de sol não a preocupava. Era ali o seu refúgio de verão, perto das cabanas de pescadores abandonadas, de eras há muito passadas, de lágrimas de esposas há muito derramadas... também ela era filha dessas mulheres e por isso, talvez, respeitava o poder assombroso do Oceano. Temia-o também, mas, acima de tudo, respeitava-o, sabia quando podia sentar-se ao pé dele, caminhar, falar e banhar-se nele. E amava-o, claro. “Quem quiser ficar comigo tem de perceber que antes dele próprio, antes de tudo e de todos, há o Mar!”, dizia frequentemente aos amigos. E os olhos brilhavam e toda gente sabia que ela estava a falar a sério e ninguém a contradizia. O tempo viria a confirmar o que ela dizia. Uma vez, numa relação e num tempo em que estava bastante apaixonada, o namorado de então tentou leva-la no Verão para a serra, para o campo. Durante a viagem, pediu para deixá-la na cidade mais próxima para assim poder apanhar o autocarro que estivesse a sair, para poder voltar para a beira do mar. Sentia-se sufocar se se afastasse muito dele. O namoro terminou no instante em que ela saiu do carro dele.
   Levantou os olhos novamente e poisou o livro. Ao longe, uma pequena traineira aproximava-se vinda da faina do dia, acompanhada pelo habitual bando de gaivotas oportunistas por um pedaço de peixe lançado fora ou algum lote mais desprotegido que pudessem larapiar. Era uma música quase mistica: o ritmos inconstantes das ondas do mar, o ruido baixo do motor da traineira e o canto das gaivotas, numa sinfonia tão dissonante como encantadora. Ela sorriu e, durante uns segundos, fechou os olhos deixando-se levar pela música ambiente. Depois levantou-se, alcançou a sua carteira e foi comprar sardinhas.

   Ao voltar, guardou o saco e sentou-se novamente. Ficou a olhar o horizonte, enrubescido. O Sol preparava-se para partir para paragens mais distantes, o ciclo iria ficar completo. Ao som das ondas, decidiu mergulhar naquelas cores, na sensação da areia, já fresca, nos pés, e da brisa mais forte que vinha do mar, carregada de maresia. Puxou do casaco que trouxera e pô-la pelas costas. Fechou os olhos e inspirou profundamente: queria mergulhar uma última vez naquela festa de sentidos, naquele instante único e guardá-lo dentro de si, simbolo máximo de uma felicidade extasiante, de uma eternidade contida num sopro de vento, no rebentar de uma onda, num raio de luz por entre a bruma do horizonte. Largou o sopro lentamente como quem larga a mão do amante, abriu os olhos e sorriu novamente. O sol estava prestes a mergulhar e ela a partir, com uma mochila cheia de memórias e sensações ao ombro. Afastou-se, lentamente, mas não sem antes se beijarem, ela e o  Mar, com os lábios azuis de ambos – ele, da sua cor, ela, do seu olhar -, num último movimento de dança sempre eterna...

1 comentário:

Teresa disse...

Ola Sol! Concordo plenamente com o q disse Victoria Holt. Espero q tu tb penses assim.
Kisses, Sis.